A farmacocinética estuda
o que o organismo faz com o fármaco, ao passo que a farmacodinâmica descreve o que
o fármaco faz no organismo. A principal importância de estudar as variáveis
farmacocinéticas é que elas permitem elaborar e otimizar a terapia, através da
escolha adequada da via de administração de cada fármaco, à quantidade e à
frequência de cada dose e a duração do tratamento. Após a administração do
fármaco por uma das várias vias disponíveis, quatro propriedades
farmacocinéticas determinam a velocidade do início da ação, a intensidade do
efeito e a duração da ação do fármaco:
• Absorção: primeiro, a
absorção do fármaco desde o local de administração (absorção) permite o acesso
do agente terapêutico (seja direta ou indiretamente) no plasma.
• Distribuição: segundo,
o fármaco pode, então, reversivelmente, sair da circulação sanguínea e
distribuir-se nos líquidos intersticial e intracelular.
• Biotransformação ou
metabolismo: terceiro, o fármaco pode ser biotransformado no fígado ou em
outros tecidos.
• Eliminação: finalmente,
o fármaco e seus metabólitos são eliminados do organismo na urina, na bile ou
nas fezes.
É fundamental conhecer a
via de administração mais adequada para o fármaco, pois essa é determinada
primariamente pelas propriedades do fármaco (p. ex., hidra ou
lipossolubilidade, ionização) e pelos objetivos terapêuticos (p. ex., a
necessidade de um início rápido de ação, a necessidade de tratamento por longo
tempo, ou a restrição de acesso a um local específico).
Absorção
Absorção é a
transferência de um fármaco do seu local de administração para a corrente
sanguínea por meio de um dos vários mecanismos (quando um fármaco é intravenoso
considera-se que a absorção é completa). A velocidade e a eficiência da
absorção dependem de dois fatores: fatores moleculares e da via de
administração (o que influencia sua biodisponibilidade).
Mecanismos
de absorção de fármacos a partir do TGI
Dependendo das
propriedades químicas da molécula, os fármacos podem ser absorvidos do TGI por
difusão passiva, difusão facilitada, transporte ativo ou por endocitose.
1. Difusão passiva: o fármaco se move da região com concentração
elevada para a que tem baixa concentração. A difusão passiva não envolve
transportador, não é saturável e apresenta baixa especificidade estrutural. A
grande maioria dos fármacos tem acesso ao organismo por esse mecanismo.
Fármacos hidrossolúveis atravessam as membranas celulares através de canais ou
poros aquosos, e os lipossolúveis movem-se facilmente através da maioria das
membranas biológicas devido à sua solubilidade na bicamada lipídica.
2. Difusão facilitada: outros fármacos podem entrar na célula por meio
de proteínas transportadoras transmembrana especializadas que facilitam a
passagem de grandes moléculas. Essas proteínas transportadoras sofrem
alterações conformacionais, permitindo a passagem de fármacos ou moléculas
endógenas para o interior da célula, movendo-os de áreas de alta concentração
para áreas de baixa concentração. Esse processo é denominado difusão
facilitada. Ele não requer energia, pode ser saturado e inibido por compostos
que competem pelo transportador.
3. Transporte ativo: essa forma de entrada de fármacos também envolve
transportadores proteicos específicos que atravessam a membrana. Poucos
fármacos cujas estruturas se assemelham às de metabólitos de ocorrência natural
são transportados através da membrana celular usando esses transportadores
proteicos específicos. O transporte ativo dependente de energia é movido pela
hidrólise de trifosfato de adenosina. Ele é capaz de mover fármacos contra um
gradiente de concentração - ou seja, de uma região com baixa concentração de
fármaco para uma com concentração mais elevada. O processo tem cinética de
saturação para o transportador que muito se assemelha à apresentada pela reação
enzima-substrato, que mostra velocidade máxima em níveis elevados de substrato
quando todos os locais ativos estão ligados com substrato. Os sistemas de
transporte ativo são seletivos e podem ser inibidos competitivamente por outras
substâncias cotransportadas.
Fatores
que influenciam a absorção
1.
Efeito do pH na absorção de fármacos. A
maioria dos fármacos é ácido fraco ou base fraca. Fármacos ácidos (HA) liberam
um próton (H+) causando a formação de um ânion (A-).
2.
As bases fracas (H+) também podem liberar
um H+. Contudo, a forma protonada dos fármacos básicos, em geral, é carregada,
e a perda do próton produz a base não ionizada.
Um fármaco atravessa a membrana mais facilmente se ele
estiver não ionizado. Assim, para os ácidos fracos, a forma HA não ionizada
consegue permear através das membranas, mas o A- não consegue. Para a base
fraca, a forma não ionizada consegue penetrar através das membranas celulares,
contudo os hidrogênios protonados não conseguem. Por isso, a concentração
efetiva da forma permeável de cada fármaco no seu local de absorção é
determinada pelas concentrações relativas entre as formas ionizada e não
ionizada. A relação entre as duas formas é, por sua vez, determinada pelo pH no
local de absorção e pela força do ácido ou base fracos, que é representada pela
constante de ionização, o pKª.
Os fatores seguintes estão relacionados, então é
preciso enxerga-los em conjunto.
Fluxo
de sangue no local de absorção.
Como o fluxo de sangue no intestino é muito maior do
que o fluxo no estômago, a absorção no intestino é maior do que no estômago.
Área
ou superfície disponível para absorção.
Com uma superfície rica em bordas de escova contendo
microvilosidades, o intestino tem uma superfície cerca de 1.000 vezes maior do
que a do estômago, tornando a absorção de fármacos pelo intestino mais
eficiente.
Tempo
de contato com a superfície de absorção.
Se um fármaco se desloca muito rápido ao longo do TGI,
como pode ocorrer em uma diarreia intensa, ele não é bem absorvido (obs.: por
esse motivo, em diarreias e vômitos incoercíveis é indicado que o paciente use
medicamentos IV). Contudo, qualquer retardo no transporte do fármaco do
estômago para o intestino reduz a sua velocidade de absorção. (obs.: o tônus
parassimpático acelera o esvaziamento gástrico, e o tônus simpático [p. ex.,
causado pelo exercício ou por emoções estressantes] e os anticolinérgicos [p.
ex., diciclomina] o retarda. Assim, a presença de alimento no estômago dilui o
fármaco e retarda o esvaziamento gástrico. Portanto, quando um fármaco é
ingerido com o alimento, em geral, será absorvido mais lentamente.)
Expressão
da glicoproteína-P.
A glicoproteína P é uma proteína transportadora
transmembrana para vários fármacos, sendo responsável pelo transporte de várias
moléculas, incluindo fármacos, através da membrana celular. É expressa por todo
o organismo e suas funções incluem:
• No fígado: transportar fármacos para a bile visando
à sua eliminação
• Nos rins: bombear fármacos para a urina visando à
excreção
• Na placenta: transportar fármacos de volta para o
sangue materno, reduzindo, assim, a exposição do feto aos fármacos
• No intestino: transportar fármacos para o lúmen
intestinal e reduzir a absorção
• Nos capilares do cérebro: bombear os fármacos de
volta ao sangue, limitando seu acesso ao cérebro Assim, nas áreas de expressão
elevada, a glicoproteína-P diminui a absorção de fármacos. Além de transportar
vários fármacos para fora das células, ela também está associada com a
resistência a vários fármacos.
Biodisponibilidade
Biodisponibilidade é a
fração do fármaco administrado que alcança a circulação sistêmica. Por exemplo,
se 100 mg de um fármaco forem administrados por via oral e 70 mg desse fármaco
forem absorvidos inalterados, a biodisponibilidade será 0,7 ou 70°/o .
Determinar a biodisponibilidade é importante para calcular a dosagem de fármaco
para vias de administração não IV. A via de administração do fármaco, bem como
as suas propriedades físicas e químicas afetam sua biodisponibilidade.
Determinação
de biodisponibilidade. A biodisponibilidade é determinada
pela comparação dos níveis plasmáticos do fármaco depois de uma via particular
de administração (p. ex., administração oral) com os níveis plasmáticos do
fármaco obtidos por injeção IV, na qual todo o fármaco entra na circulação
rapidamente. Quando o fármaco é administrado por via oral, somente parte da
dose aparece no plasma. Lançando a concentração plasmática do fármaco contra o
tempo, pode-se mensurar a área sob a curva (ASC). Essa curva reflete a extensão
da absorção do fármaco.
Fatores
que influenciam a biodisponibilidade.
Em contraste com a administração IV, que confere
100°/o de biodisponibilidade, a administração oral de um fármaco envolve
frequentemente metabolismo de primeira passagem. Esta biotransformação, além
das características físicas e químicas do fármaco, determina a quantidade de
fármaco que alcança a circulação e a que velocidade.
Biotransformação
hepática de primeira passagem.
Quando um fármaco é absorvido a partir do TGI,
primeiro ele entra na circulação portal antes de entrar na circulação sistêmica.
Se o fármaco é rapidamente biotransformado no fígado ou na parede intestinal
durante esta passagem inicial, a quantidade de fármaco inalterado que tem
acesso à circulação sistêmica diminui. Fármacos que sofrem biotransformação de
primeira passagem elevada devem ser administrados em quantidade suficiente para
assegurar que fármaco ativo suficiente alcance a concentração desejada.
Solubilidade
do fármaco.
Fármacos muito hidrofílicos são pouco absorvidos
devido à sua inabilidade em atravessar as membranas celulares ricas em
lipídeos. Fármacos extremamente hidrofóbicos são também pouco absorvidos, pois
são totalmente insolúveis nos líquidos aquosos do organismo e, portanto, não
têm acesso à superfície das células. Para que um fármaco seja bem absorvido,
ele deve ser basicamente hidrofóbico, mas ter alguma solubilidade em soluções
aquosas. Essa é uma das razões pelas quais vários fármacos são ácidos fracos ou
bases fracas.
Instabilidade
química.
Alguns fármacos, como a
benzi/penicilina, são instáveis no pH gástrico. Outros, como a insulina, são
destruídos no TGI pelas enzimas.
Natureza
da formulação do fármaco.
A absorção do fármaco
pode ser alterada por fatores não relacionados com a sua estrutura química. Por
exemplo, o tamanho da partícula, o tipo de sal, o polimorfismo cristalino, o
revestimento entérico e a presença de excipientes (como os agentes aglutinantes
e dispersantes) podem influenciar a facilidade da dissolução e, por isso,
alterar a velocidade de absorção.
BIOEQUIVALÊNCIA:
Duas preparações de fármacos relacionados são bioequivalentes se eles
apresentam biodisponibilidades comparáveis e tempos similares para alcançar o
pico de concentração plasmática.
EQUIVALÊNCIA TERAPÊUTICA: Dois
medicamentos são terapeuticamente iguais se eles são farmaceuticamente
equivalentes com perfis clínicos e de segurança similares. (Nota: a eficácia
clínica com frequência depende da concentração sérica máxima e do tempo
necessário [após a administração] para alcançar o pico de concentração.
Portanto, dois fármacos que são bioequivalentes podem não ser equivalentes
terapeuticamente.).
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